terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Passo a passo, o plano da USAID para acabar com o governo Chávez - Carta Maior

Passo a passo, o plano da USAID para acabar com o governo Chávez - Carta Maior

Documento secreto do WikiLeaks detalha como William
Brownfield, hoje secretário-assistente do Departamento de Estado,
planejava acabar com o chavismo





Natália Viana e Luiza Bodenmuller, da Agência Pública



Agência Pública

Após o fracasso do golpe contra
Hugo Chávez em 2002, a embaixada americana em Caracas resolveu tomar
para si a tarefa de reorganizar a oposição venezuelana, apostando em uma
estratégia de longo prazo que minaria o poder do governo. Em agosto de
2004, mesmo mês do referendo revocatório promovido pela oposição com
amplo apoio da missão americana, o texano William Brownfield chegou a
Caracas, nomeado por George W. Bush, para assumir o posto de embaixador
no país. Pragmático e sucinto, William Brownfield elaborou um plano de 5
pontos para acabar com o chavismo em médio prazo, como revela um documento do WikiLeaks analisado pela Agência Pública.
 
O
documento secreto, enviado por Brownfield a Washington em 9 de novembro
de 2006, relembra as diretrizes traçadas dois anos antes. “O foco da
estratégia é: 1) Fortalecer instituições democráticas, 2) Infiltrar-se
na base política de Chávez, 3) Dividir o Chavismo, 4) Proteger negócios
vitais para os EUA, e 5) Isolar Chávez internacionalmente”, escreveu
Brownfield, hoje secretário anti-narcóticos do Departamento de Estado –
órgão que cuida do treinamento de forças policiais estrangeiras pelos
EUA, incluindo em dezenas de países latinoamericanos.
 
Entre
2004 e 2006, a Usaid realizou diversas ações para levar adiante a
estratégia divisada por Brownfield, doando nada menos de US$ 15 milhões a
mais de 300 organizações da sociedade civil. A Usaid, através do seu
Escritório de Iniciativas de Transição (OTI) – criado dois meses depois
do fracassado golpe – deu assistência técnica e capacitação às
organizações e colocou-as em contato com movimentos internacionais. Além
disso, explica o documento, “desde a chegada da OTI foram formadas 39
organizações com foco em advocacy (convencimento); muitas dessas organizações são resultado direto dos programas e financiamentos da OTI”.
 
Um
dos principais objetivos da Usaid era levar casos de violações de
direitos humanos para a corte interamericana de Direitos Humanos com o
objetivo de obter condenações e minar a credibilidade internacional do
governo venezuelano. Foi o que fez, segundo o relato do ex-embaixador, o
Observatório das Prisões Venezuelanas, que conseguiu que a Corte
emitisse uma decisão requerendo medidas especiais para resolver as
violações de direitos humanos na prisão ‘La Pica’, no leste do país.
Outra organização, a “Human Rights Lawyers Network in Bolivar State”
(rede de advogados de direitos humanos no estado de Bolívar), apresentou
à Corte Internacional um caso de massacre de 12 mineiros pelo exército
Venezuelano no estado de Bolívar. O grupo foi criado, segundo
Brownfield, “a partir do programa da Freedom House, e um financiamento
da DAI distribui pequenas bolsas no programa”.
 
A
empresa DAI – Development Alternatives Inc – foi de 2004 a 2009 a
principal gerente da verba da Usaid no país, tendo distribuído milhões
de dólares a diversas organizações a partir da estratégia do governo
norte-americano. (Clique aqui para ler mais sobre a DAI)
Ela
desembolsou, por exemplo, US$ 726 mil em 22 bolsas para organizações de
direitos humanos, segundo o documento do WikiLeaks. Também ajudou a
criar o Centro de Direitos Humanos da Universidade Central da Venezuela.
“Eles têm tido sucesso em chamar a atenção para o Direito de Cooperação
Internacional e à situação dos direitos humanos na Venezuela, como uma
voz nacional e internacional”, explica o texano Brownfield no despacho
diplomático.
 
Outras
áreas nas quais financiamento para ONGs ajudaria a concretizar a
estratégia americana incluíam tentativas de neutralizar o “mecanismo de
controle Chavista”, que utiliza “vocabulário democrático” para apoiar a
ideologia revolucionária bolivariana, nas palavras do diplomata. “A OTI
tem lutado contra isso através de um programa de educação cívica chamado
‘Democracia entre nós’, cujo princípio era ensinar ao povo venezuelano o
que, de fato, significava democracia. Programas educacionais dirigidos,
como tolerância política, participação e direitos humanos já atingiram
mais de 600 mil pessoas”, diz o documento.
 
 
DIVIDINDO O CHAVISMO
 
Em
seguida, o documento detalha as estratégias para “dividir o chavismo”,
baseadas na concepção de que Chávez tentava “polarizar a sociedade
venezuelana usando uma retórica de ódio e violência”. O remédio, na
cabeça de Brownfield, seria dar auxílio a ONGs locais que trabalham em
“fortalezas Chavistas” e com os “líderes Chavistas” para “contra-atacar a
retórica” e “promover alianças”. Os esforços da Usaid neste sentido
custaram US$ 1,1 milhão para atingir 238 mil pessoas em mais de 3 mil
fóruns, workshops e sessões de treinamento, “transmitindo valores
alternativos e dando oportunidade a ativistas de oposição de interagirem
com Chavistas, obtendo o desejado efeito de tirá-los lentamente do
Chavismo”.
 
Exemplos
são o grupo “Visor Participativo” composto por 34 ONGs formadas e
supervisionadas pela OTI, para trabalhar no fortalecimento das
municipalidades. “Enquanto Chávez tenta recentralizar o país, a OTI,
através do Visor, está apoiando a descentralização”, escreve Brownfield.
 
Outra
iniciativa, a custo superior a US$ 1,2 milhões, promoveu a criação de
54 projetos sociais em toda a Venezuela “permitindo visitas do
Embaixador a áreas pobres do país e demonstrando a preocupação do
governo dos EUA com o povo venezuelano”, detalha Brownfield. “Esse
programa confunde os bolivarianos e atrasa a tentativa de Chávez usar os
EUA como um ‘inimigo unificador’”.
 
Com
o objetivo de “isolar Chávez internacionalmente”, o embaixador gaba-se
de que a USAID, através das ONG americana Freedom House, financiou
viagens de membros de organizações de direitos humanos da Venezuela ao
México, Guatemala, Peru, Chile, Argentina, Costa Rica e Washington.
“Além disso, o DAI trouxe dezenas de líderes internacionais à Venezuela e
também professores universitários, membros de ONGs e líderes políticos
para participarem de workshops e seminários, para que eles voltassem aos
seus países de origem entendendo melhor a realidade da Venezuela,
tornando-se fortes aliados da oposição venezuelana”.
 
Brownfield
termina o documento, escrito em 2006, com um alerta: “Chávez deve
vencer a eleição presidencial de 3 de dezembro e a OTI espera que a
atmosfera para o trabalho na Venezuela se torne mais complicada”. De
fato, o embaixador saiu do país no anoseguinte,
assumindo o mesmo posto na Colômbia antes de ser designado pelo governo
Obama para cuidar de cooperação policial com outros países.
 
Antes
de Brownfield assumir a política dos EUA para a Venezuela o escritório
de Iniciativas de Transição (OTI) focava sua atuação no fortalecimento
dos partidos políticos de oposição – como mostra outro documento do WikiLeaks,
de 13 de julho de 2004 – incluindo um projeto de US$ 550 mil destinado a
promover consultorias de especialistas latinoamericanos em liderança
política e estratégia aos partidos, e um projeto de US$ 450 mil com o
International Republican Institute (IRI) – do Partido Republicano - 
para treinar os partidos de oposição a “delinear, planejar e executar
campanhas eleitorais” em “escolas de treinamento de campanha”.
Em
2010, sob crescente pressão do governo venezuelano, o escritório da OTI
no país foi fechado, e suas funções foram transferidas para o escritório
para América Latina e Caribe da Usaid.











Créditos da foto: Agência Pública

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