Direito do espetáculo
Ex-candidata a PGR, Ela Wiecko diz que "lava jato" passou dos limites
A
subprocuradora-geral da República Ela Wiecko de Castilho afirmou nesta
quarta-feira (30/8) que processos relacionados à operação “lava jato”
seguem caminhos de exceção, em que se relativizam direitos, há
“seletividade na escolha dos alvos da investigação” e o desejo de
democracia é substituído pelo desejo de audiência. A avaliação foi feita
em painel do 23º Seminário Internacional de Ciências Criminais, em São
Paulo, a uma plateia de operadores do Direito.
Ela Wiecko foi
vice-procuradora-geral da República na gestão de Rodrigo Janot até
agosto de 2016 e uma das oito candidatas para ocupar a vaga a partir de
setembro deste ano. Convidada para evento promovido pelo Instituto
Brasileiro de Ciências Criminais, afirmou nesta quarta que o processo
penal de exceção ainda não é comum em todo o Ministério Público Federal,
mas é visível no trabalho de colegas de Curitiba e, “em parte”, dentro
da PGR.
“O que foi feito nessas operações passou de alguns
limites, algumas garantias individuais: da presunção da inocência, da
proteção da imagem, do devido processo que seja realmente equilibrado.
Por que alguns processos andam mais depressa do que os outros? A gente
não ganha nada com isso.”
A palestrante afirmou que tanto a “lava jato” como a Ação Penal 470,
conhecida como processo do mensalão, se encaixam em sete características
contrárias ao garantismo, formuladas pelo criminalista e professor
Fernando Hideo Lacerda.
Na lista estão a aplicação distorcida da
teoria do domínio do fato e julgamentos de acordo com a “opinião
pública(da)”, que segundo a subprocuradora transformam procedimentos em
espetáculo e cumprem “interesses dos sistemas político e midiático”.
Citando
a filósofa Márcia Tiburi, Wiecko disse que a espetacularização do
processo fabrica uma luta entre o bem e o mal: “para punir os bandidos
que violam a lei, os mocinhos também violam a lei”. Para agradar a
audiência, continua, desconsideram-se consequências sociais e econômicas
e são vazadas informações sigilosas aos poucos, de acordo com
interesses.
Ela também criticou conduções coercitivas, por
entender que a prática “não está alcançada nas regras legais”, e disse
que a seletividade do processo penal — comum no sistema brasileiro — tem
sido ampliada para escolher o tempo em que cada investigado será alvo
de operações.
Segundo a palestrante, o processo penal de exceção
originou-se no Brasil a partir dos anos 1990, com especialistas que
queriam estender a Justiça penal para classes mais privilegiadas: nas
bases ideológicas desse entendimento, destacou o juiz federal Sergio
Moro e o criminalista gaúcho Luciano Feldens. O problema, na visão dela,
é que a aplicação do princípio “simplifica as coisas” ao avaliar que a
impunidade é sempre causa da corrupção.
“O Ministério Público, se
quer atuar na história da teoria econômica do Direito, tem que atuar de
forma regrada, não pode ter pena negociada caso a caso. No que se refere
ao acordo de leniência, a participação do Ministério Público faz com
que a instituição entre na regulação da economia. A gente quer isso?
Isso está na Constituição? Isso precisa ser claramente discutido. Tudo o
que aconteceu até agora mostra que temos de enfrentar o problema de
estabelecer democracia no país.”
Ela Wiecko declarou ainda que a
operação italiana mãos limpas, que inspirou a “lava jato”, acabou
posteriormente tendo procedimentos de exceção aplicados aos mais pobres,
como suspeitos de tráfico de drogas.
Código flexível
O professor Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, da
Universidade Federal do Paraná e convidado para o mesmo painel, afirmou
que o discurso da eficiência penal tem ultrapassado a preocupação com o
respeito ao processo de Justiça.
Ele afirmou que, como diz o juiz Alexandre Morais da Rosa, cada vara
do país adota hoje um Código Penal próprio. Embora considere comum a
existência de juízes contra legem, Miranda Coutinho disse que tribunais superiores passaram a fazer “vista grossa” para condutas irregulares.
“Agora
não tem mais controle”, reclamou. “Trânsito em julgado não é nem mais
trânsito em julgado.” Segundo o professor, a busca por mais punição
desde os anos 1990 gerou apenas mais medo da violência, sem resultados
positivos.
subprocuradora-geral da República Ela Wiecko de Castilho afirmou nesta
quarta-feira (30/8) que processos relacionados à operação “lava jato”
seguem caminhos de exceção, em que se relativizam direitos, há
“seletividade na escolha dos alvos da investigação” e o desejo de
democracia é substituído pelo desejo de audiência. A avaliação foi feita
em painel do 23º Seminário Internacional de Ciências Criminais, em São
Paulo, a uma plateia de operadores do Direito.
Ela Wiecko foi
vice-procuradora-geral da República na gestão de Rodrigo Janot até
agosto de 2016 e uma das oito candidatas para ocupar a vaga a partir de
setembro deste ano. Convidada para evento promovido pelo Instituto
Brasileiro de Ciências Criminais, afirmou nesta quarta que o processo
penal de exceção ainda não é comum em todo o Ministério Público Federal,
mas é visível no trabalho de colegas de Curitiba e, “em parte”, dentro
da PGR.
“O que foi feito nessas operações passou de alguns
limites, algumas garantias individuais: da presunção da inocência, da
proteção da imagem, do devido processo que seja realmente equilibrado.
Por que alguns processos andam mais depressa do que os outros? A gente
não ganha nada com isso.”
A palestrante afirmou que tanto a “lava jato” como a Ação Penal 470,
conhecida como processo do mensalão, se encaixam em sete características
contrárias ao garantismo, formuladas pelo criminalista e professor
Fernando Hideo Lacerda.
Na lista estão a aplicação distorcida da
teoria do domínio do fato e julgamentos de acordo com a “opinião
pública(da)”, que segundo a subprocuradora transformam procedimentos em
espetáculo e cumprem “interesses dos sistemas político e midiático”.
Citando
a filósofa Márcia Tiburi, Wiecko disse que a espetacularização do
processo fabrica uma luta entre o bem e o mal: “para punir os bandidos
que violam a lei, os mocinhos também violam a lei”. Para agradar a
audiência, continua, desconsideram-se consequências sociais e econômicas
e são vazadas informações sigilosas aos poucos, de acordo com
interesses.
Ela também criticou conduções coercitivas, por
entender que a prática “não está alcançada nas regras legais”, e disse
que a seletividade do processo penal — comum no sistema brasileiro — tem
sido ampliada para escolher o tempo em que cada investigado será alvo
de operações.
Segundo a palestrante, o processo penal de exceção
originou-se no Brasil a partir dos anos 1990, com especialistas que
queriam estender a Justiça penal para classes mais privilegiadas: nas
bases ideológicas desse entendimento, destacou o juiz federal Sergio
Moro e o criminalista gaúcho Luciano Feldens. O problema, na visão dela,
é que a aplicação do princípio “simplifica as coisas” ao avaliar que a
impunidade é sempre causa da corrupção.
“O Ministério Público, se
quer atuar na história da teoria econômica do Direito, tem que atuar de
forma regrada, não pode ter pena negociada caso a caso. No que se refere
ao acordo de leniência, a participação do Ministério Público faz com
que a instituição entre na regulação da economia. A gente quer isso?
Isso está na Constituição? Isso precisa ser claramente discutido. Tudo o
que aconteceu até agora mostra que temos de enfrentar o problema de
estabelecer democracia no país.”
Ela Wiecko declarou ainda que a
operação italiana mãos limpas, que inspirou a “lava jato”, acabou
posteriormente tendo procedimentos de exceção aplicados aos mais pobres,
como suspeitos de tráfico de drogas.
Código flexível
O professor Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, da
Universidade Federal do Paraná e convidado para o mesmo painel, afirmou
que o discurso da eficiência penal tem ultrapassado a preocupação com o
respeito ao processo de Justiça.
Ele afirmou que, como diz o juiz Alexandre Morais da Rosa, cada vara
do país adota hoje um Código Penal próprio. Embora considere comum a
existência de juízes contra legem, Miranda Coutinho disse que tribunais superiores passaram a fazer “vista grossa” para condutas irregulares.
“Agora
não tem mais controle”, reclamou. “Trânsito em julgado não é nem mais
trânsito em julgado.” Segundo o professor, a busca por mais punição
desde os anos 1990 gerou apenas mais medo da violência, sem resultados
positivos.
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