Receita investiga se grandes bancos do país estão sonegando tributos
Perda potencial de arrecadação com bancos pode ter ultrapassado os R$ 15 bilhões em 2016 |
A Receita Federal apura se os principais bancos privados do país usam de
maneira abusiva, com o objetivo de sonegar impostos, o chamado
planejamento tributário.
Diante disso, segundo a Folha apurou, foi montado um grupo de
trabalho com 24 auditores de Brasília e São Paulo, onde há uma delegacia
especializada em crimes financeiros, para monitorar essas instituições.
Planejamento tributário é uma estratégia não necessariamente ilegal
praticada, em geral, por grandes empresas para reduzir o recolhimento de
tributos.
A suposta manobra sob monitoramento da Receita envolveria operações de
transferência e venda de carteiras de crédito. Os nomes dos bancos estão
mantidos em sigilo pois o caso ainda está em apuração.
Alguns representantes dos bancos já foram chamados para conversas informais na Receita em São Paulo.
Se as suspeitas se confirmarem, as instituições estão sujeitas a
pagamento de juros e multa de 150% em cima do valor que não foi pago.
ARRECADAÇÃO
Para o órgão, a queda dos tributos pagos pelo sistema financeiro tem atrapalhado uma retomada mais rápida na arrecadação neste ano.
A avaliação, de acordo com uma pessoa próxima ao caso, é que o
monitoramento, iniciado no final de julho, já influenciou na alta
expressiva das receitas federais observada no mês passado.
A tributação sobre o lucro, com destaque para o IRPJ (Imposto de Renda
Pessoa Jurídica) e o CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido),
responde por cerca de um terço do total arrecadado pela Receita Federal.
Os bancos são responsáveis pela maior parte desse bolo por serem taxados com maiores alíquotas.
Desde 2014, a Receita identificou um forte descolamento entre os resultados do setor e o desempenho da arrecadação.
O movimento vem se intensificando ano a ano, e atingiu o ápice ao longo
de 2017, quando, mês após mês, o volume arrecadado vinha se mostrando
distante das projeções da própria Receita.
O Fisco ainda está calculando quanto os bancos podem ter deixado de pagar.
Em 2016, indícios apontam que a perda potencial de arrecadação pode ter ultrapassado os R$ 15 bilhões.
A avaliação é que o quadro piorou neste ano. Segundo palavras de uma
pessoa da equipe econômica, o recolhimento feito pelos bancos foi o
"principal componente" da arrecadação a flutuar no ano.
Em julho, por exemplo, o recolhimento por estimativa de IRPJ e CSLL das
instituições financeiras desabou 67,35%, descontada a inflação do
período, em relação ao mesmo mês de 2016.
Essa mesma receita cresceu 43,43% no mês passado, um dos fatores que
ajudaram as receitas federais como um todo a subirem mais de 10%.
Durante a divulgação dos dados de agosto, a Receita atribuiu a reação
surpreendente da arrecadação não só à recuperação da atividade
econômica, mas também a "ações da Receita Federal".
PROVISÕES
Um executivo de um grande banco, que falou com a Folha sob a
condição de anonimato, argumenta que o quadro de recolhimentos mais
baixos pode ser explicado pelas elevadas provisões feitas pelas
instituições financeiras para eventual inadimplência de devedores
duvidosos.
Essas provisões geram créditos tributários que podem ser usados para
abater impostos, e isso, na avaliação dele, explica o descompasso.
A Receita costuma fazer um mapeamento interno minucioso por regime
tributário e sabia que os bancos vinham compensando prejuízos.
Mas, em algum momento, o volume entre o que a Receita esperava arrecadar
e o que os bancos recolhiam passou a registrar uma diferença muito
grande, o que chamou a atenção do órgão.
Procurada pela reportagem, a Febraban (Federação Brasileira de Bancos)
disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que não pode comentar o
monitoramento da Receita por não ter um diagnóstico sobre o tema.
"Não temos estudo atualizado dos valores arrecadados e nem um
diagnóstico de todo o sistema, que pode ser afetado por questões
individuais das entidades", disse a Federação em nota.
Um executivo de um grande banco ouvido pela reportagem, que preferiu não
se identificar, disse que não tem conhecimento de que as operações sob
monitoramento do fisco sejam feitas por instituições financeiras.
Ele ponderou que uma das operações sob análise, de antecipação de
prejuízo, não faria sentido, pois realizar já um resultado negativo
implicaria não gerar créditos tributários. Os créditos, criados quando o
banco reserva provisões para o caso de inadimplência de devedores
duvidosos, são usados para abatimento de impostos.
Atenta à flutuação da arrecadação do setor financeiro, a Receita Federal
monitora dois tipos específicos de operação feita pelos bancos.
Segundo a Folha apurou, em uma delas as instituições financeiras
transferem carteiras de crédito lucrativas para empresas do mesmo grupo
que tenham prejuízo fiscal.
Esse lucro é abatido pelo prejuízo fiscal, o que reduz o resultado
positivo sujeito à tributação do banco. Em outras palavras, a
instituição paga menos IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica) e CSLL
(Contribuição Social sobre o Lucro Líquido).
Advogados ouvidos pela reportagem avaliam que é um tipo de operação que,
apesar de não ser ilícita, pode ser objeto de autuação da Receita.
"É uma operação complicada, que está no limbo. Não acho que seja ilícito
ou ilegal, mas é discutível", diz o advogado tributarista Jarbas
Andrade Machioni, presidente da Comissão de Direito Empresarial da
OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil).
Em outra operação monitorada pelo órgão, a instituição financeira vende
uma carteira de crédito com dívidas em atraso para uma empresa também do
mesmo grupo por um montante abaixo do valor de face da carteira.
Com isso, antecipa um prejuízo que poderia ser registrado somente no
futuro ou que nem se realizaria, o que também reduz o lucro sujeito ao
pagamento de impostos.
"Essa é uma operação mais complicada", avalia Machioni. "Você realiza um
prejuízo já, cria uma circunstância em que vai ter um prejuízo
tributário agora, descolando o cenário da realidade".
Para Claudio Gallina, diretor da área de bancos da agência Fitch
Ratings, o efeito de casos como esses sobre a classificação de risco dos
bancos envolvidos dependeria do valor das multas e de eventuais
recursos a serem devolvidos, assim como do prazo de possíveis
desembolsos que venham a ocorrer.
1. Transferência de carteira
O banco transfere uma carteira de crédito lucrativa para outras empresas
do mesmo grupo econômico que apresentam prejuízos fiscais. Isso diminui
o resultado positivo que está sujeito à tributação da instituição
financeira
2. Antecipação de prejuízo
A instituição financeira vende uma carteira de crédito com dívidas em
atraso para empresa do mesmo grupo por um montante abaixo do valor da
carteira. Com isso, antecipa um prejuízo que poderia ser registrado no
futuro ou que?não se realizaria, reduzindo o lucro sujeito à tributação
PENALIDADE SE SUSPEITAS SE CONFIRMAREM
Juros e multa de 150% sobre os valores que deixaram de ser pagos
maneira abusiva, com o objetivo de sonegar impostos, o chamado
planejamento tributário.
Diante disso, segundo a Folha apurou, foi montado um grupo de
trabalho com 24 auditores de Brasília e São Paulo, onde há uma delegacia
especializada em crimes financeiros, para monitorar essas instituições.
Planejamento tributário é uma estratégia não necessariamente ilegal
praticada, em geral, por grandes empresas para reduzir o recolhimento de
tributos.
A suposta manobra sob monitoramento da Receita envolveria operações de
transferência e venda de carteiras de crédito. Os nomes dos bancos estão
mantidos em sigilo pois o caso ainda está em apuração.
Alguns representantes dos bancos já foram chamados para conversas informais na Receita em São Paulo.
Se as suspeitas se confirmarem, as instituições estão sujeitas a
pagamento de juros e multa de 150% em cima do valor que não foi pago.
ARRECADAÇÃO
Para o órgão, a queda dos tributos pagos pelo sistema financeiro tem atrapalhado uma retomada mais rápida na arrecadação neste ano.
A avaliação, de acordo com uma pessoa próxima ao caso, é que o
monitoramento, iniciado no final de julho, já influenciou na alta
expressiva das receitas federais observada no mês passado.
A tributação sobre o lucro, com destaque para o IRPJ (Imposto de Renda
Pessoa Jurídica) e o CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido),
responde por cerca de um terço do total arrecadado pela Receita Federal.
Os bancos são responsáveis pela maior parte desse bolo por serem taxados com maiores alíquotas.
Desde 2014, a Receita identificou um forte descolamento entre os resultados do setor e o desempenho da arrecadação.
O movimento vem se intensificando ano a ano, e atingiu o ápice ao longo
de 2017, quando, mês após mês, o volume arrecadado vinha se mostrando
distante das projeções da própria Receita.
O Fisco ainda está calculando quanto os bancos podem ter deixado de pagar.
Em 2016, indícios apontam que a perda potencial de arrecadação pode ter ultrapassado os R$ 15 bilhões.
A avaliação é que o quadro piorou neste ano. Segundo palavras de uma
pessoa da equipe econômica, o recolhimento feito pelos bancos foi o
"principal componente" da arrecadação a flutuar no ano.
Em julho, por exemplo, o recolhimento por estimativa de IRPJ e CSLL das
instituições financeiras desabou 67,35%, descontada a inflação do
período, em relação ao mesmo mês de 2016.
Essa mesma receita cresceu 43,43% no mês passado, um dos fatores que
ajudaram as receitas federais como um todo a subirem mais de 10%.
Durante a divulgação dos dados de agosto, a Receita atribuiu a reação
surpreendente da arrecadação não só à recuperação da atividade
econômica, mas também a "ações da Receita Federal".
PROVISÕES
Um executivo de um grande banco, que falou com a Folha sob a
condição de anonimato, argumenta que o quadro de recolhimentos mais
baixos pode ser explicado pelas elevadas provisões feitas pelas
instituições financeiras para eventual inadimplência de devedores
duvidosos.
Essas provisões geram créditos tributários que podem ser usados para
abater impostos, e isso, na avaliação dele, explica o descompasso.
A Receita costuma fazer um mapeamento interno minucioso por regime
tributário e sabia que os bancos vinham compensando prejuízos.
Mas, em algum momento, o volume entre o que a Receita esperava arrecadar
e o que os bancos recolhiam passou a registrar uma diferença muito
grande, o que chamou a atenção do órgão.
Procurada pela reportagem, a Febraban (Federação Brasileira de Bancos)
disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que não pode comentar o
monitoramento da Receita por não ter um diagnóstico sobre o tema.
"Não temos estudo atualizado dos valores arrecadados e nem um
diagnóstico de todo o sistema, que pode ser afetado por questões
individuais das entidades", disse a Federação em nota.
Um executivo de um grande banco ouvido pela reportagem, que preferiu não
se identificar, disse que não tem conhecimento de que as operações sob
monitoramento do fisco sejam feitas por instituições financeiras.
Ele ponderou que uma das operações sob análise, de antecipação de
prejuízo, não faria sentido, pois realizar já um resultado negativo
implicaria não gerar créditos tributários. Os créditos, criados quando o
banco reserva provisões para o caso de inadimplência de devedores
duvidosos, são usados para abatimento de impostos.
CARTEIRAS DE CRÉDITO
Atenta à flutuação da arrecadação do setor financeiro, a Receita Federal
monitora dois tipos específicos de operação feita pelos bancos.
Segundo a Folha apurou, em uma delas as instituições financeiras
transferem carteiras de crédito lucrativas para empresas do mesmo grupo
que tenham prejuízo fiscal.
Esse lucro é abatido pelo prejuízo fiscal, o que reduz o resultado
positivo sujeito à tributação do banco. Em outras palavras, a
instituição paga menos IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica) e CSLL
(Contribuição Social sobre o Lucro Líquido).
Advogados ouvidos pela reportagem avaliam que é um tipo de operação que,
apesar de não ser ilícita, pode ser objeto de autuação da Receita.
"É uma operação complicada, que está no limbo. Não acho que seja ilícito
ou ilegal, mas é discutível", diz o advogado tributarista Jarbas
Andrade Machioni, presidente da Comissão de Direito Empresarial da
OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil).
Em outra operação monitorada pelo órgão, a instituição financeira vende
uma carteira de crédito com dívidas em atraso para uma empresa também do
mesmo grupo por um montante abaixo do valor de face da carteira.
Com isso, antecipa um prejuízo que poderia ser registrado somente no
futuro ou que nem se realizaria, o que também reduz o lucro sujeito ao
pagamento de impostos.
"Essa é uma operação mais complicada", avalia Machioni. "Você realiza um
prejuízo já, cria uma circunstância em que vai ter um prejuízo
tributário agora, descolando o cenário da realidade".
Para Claudio Gallina, diretor da área de bancos da agência Fitch
Ratings, o efeito de casos como esses sobre a classificação de risco dos
bancos envolvidos dependeria do valor das multas e de eventuais
recursos a serem devolvidos, assim como do prazo de possíveis
desembolsos que venham a ocorrer.
*
AS OPERAÇÕES SOB MONITORAMENTO DA RECEITA1. Transferência de carteira
O banco transfere uma carteira de crédito lucrativa para outras empresas
do mesmo grupo econômico que apresentam prejuízos fiscais. Isso diminui
o resultado positivo que está sujeito à tributação da instituição
financeira
2. Antecipação de prejuízo
A instituição financeira vende uma carteira de crédito com dívidas em
atraso para empresa do mesmo grupo por um montante abaixo do valor da
carteira. Com isso, antecipa um prejuízo que poderia ser registrado no
futuro ou que?não se realizaria, reduzindo o lucro sujeito à tributação
PENALIDADE SE SUSPEITAS SE CONFIRMAREM
Juros e multa de 150% sobre os valores que deixaram de ser pagos
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