sábado, 21 de junho de 2014

Por que a raiva ?

Por que a direita anda mais raivosa do que nunca? - Carta Maior

Por que a  raiva?

Os barões das grandes corporações midiáticas perceberam que,
para haver uma oposição de direita forte, é preciso uma ampla opinião
pública direitista.





Antonio Lassance (*)



Charge de Vitor Teixeira




Faz tempo que as
campanhas eleitorais são espetáculos dantescos, movidos por baixarias
sem limites. Enquanto o Tribunal Superior Eleitoral fica muitas vezes
cuidando da perfumaria, os dinossauros reinam.

Mas há algo de novo nesta campanha.

A
começar do fato de que boa parte da perversidade de campanha seguia,
antes, o seguinte roteiro: denúncias na imprensa, primeiro em jornais e
revistas, que depois se propagavam na tevê e no rádio e, finalmente,
ganhavam a rua pela ação dos cabos eleitorais.

Agora, o roteiro
é: denúncias pela imprensa, mas divulgadas primeiro via internet;
propagação pelas redes sociais; repetição pela tevê e pelo rádio e, por
último, sua consolidação  pelo colunismo e editorialismo da imprensa
tradicional.

Embora essa imprensa ainda seja, normalmente, a dona
da informação, seu impacto é cada vez menos medido pela audiência do
próprio meio - que anda em declínio em praticamente todos os veículos
tradicionais - e mais pela sua capacidade de propagação pela internet -
blogs, redes sociais e canais de vídeo, principalmente pelo Youtube. E a
versão que se propaga da notícia acaba sendo tão ou mais importante do
que a notícia em si.

Antes, as pesquisas de opinião calibravam os
rumos das campanhas. Nesta eleição, a internet é quem tende a ditar o
ritmo. As pesquisas vão servir para aferir, tardiamente, o impacto de
alguns assuntos que ganharam peso na guerrilha virtual.

Antes, o
trabalho de amaldiçoar pra valer os adversários políticos era feito
pelos cabos eleitorais que batiam de porta em porta. Agora, os cabos
eleitorais que caçam votos perambulam pelos portais de internet, pelos
canais de vídeo e entram nos endereços dos eleitores pelas redes
sociais.

Uma outra diferença, talvez tão decisiva quanto essa, é
que a direita resolveu aparecer. Antes, o discurso da direita era de que
não existia mais esse negócio de "direita x esquerda".

A
direita, finalmente, saiu do armário e anda mais raivosa do que nunca.
Em parte, a raiva vem do medo de que, talvez, ela tenha perdido o jeito
de ganhar eleições e de influenciar os partidos.

Por outro lado, a
direita imagina que a atual campanha petista está mais vulnerável que
em outras épocas. A raiva é explicada, nesse aspecto, pelo espírito de
"é agora ou nunca".

Os bombardeios midiáticos raivosos têm assumido feições mais pronunciadamente ideológicas.

Ao
contrário de outras eleições, os ataques têm não só mentiras,
xingamentos e destemperos verbais de todos os tipos. Têm uma cara de
pensamento de direita.

Querem não apenas desbancar adversários. Querem demarcar um campo.

Não
é só raiva contra um partido. É ódio de classe contra tudo e contra
todos os que se beneficiam (e nem tanto quanto deveriam) de algumas das
políticas governamentais.

É ódio contra sindicatos de
trabalhadores, organizações comunitárias, movimentos de excluídos (Sem
Terra, Sem Teto), grupos em defesa de minorias e de direitos humanos que
priorizam a crítica a privilégios sociais e aos desníveis
socioeconômicos mais profundos.

A mídia direitista tem
desempenhado um papel central. Sua principal missão é orientar os
ataques para que eles tenham consequência política e ideológica no seio
da sociedade brasileira.

Como sempre, a mídia é diretamente
responsável por articular atores dispersos e colocá-los em evidência,
conforme uma pauta predeterminada.

Embora seja uma característica
recorrente, no Brasil, a mídia tradicional comportar-se como partido de
oposição, nos últimos anos ela parece seguir uma nova estratégia.

Os
barões das grandes corporações midiáticas brasileiras, com a ajuda de
seus ideólogos, perceberam que, para haver uma oposição de direita
forte, é preciso formar uma ampla opinião pública direitista.

Antes
mesmo de cobrar que os partidos se comportem e assumam o viés de
direita, é preciso haver uma base social que os obrigue a agir enquanto
tal.
A mídia tradicional entendeu que os partidos oposicionistas são
erráticos em seus programas e na sua linha política não por falta de
conservadorismo de suas principais lideranças, mas pela ausência de
apelo social em sua pregação.

Em função disso, coisas como o
Instituto Millenium se tornaram de grande importância. O Millenium tem,
entre seus mantenedores e parceiros, a Abert (controlada pelas
organizações Globo) e os grupos Abril, RBS e Estadão. O instituto é
também sustentado por outras grandes empresas, como a Gerdau, a Suzano e
o Bank of America.

O Millenium tenta fazer o amálgama entre
mídia, partidos e especialistas conservadores para gerar um programa
direitista consistente, politicamente atraente e socialmente aderente.

O
colunismo midiático, em todas as suas frentes, é outro espaço feito sob
medida para juntar jornalistas, especialistas e lideranças partidárias
dedicadas a reforçar alguns interesses contrariados por algumas
políticas públicas criadas nos últimos 12 anos.

A estratégia
midiática de reinvenção da direita brasileira representa, no fundo, uma
tentativa desesperada e consciente dessa mesma mídia de reposicionar-se
nas relações de poder, diante da ameaça de novos canais de comunicação e
de novos atores que ganharam grande repercussão na opinião pública.

Com
seu declínio econômico e o fim da aura de fonte primordial da
informação, o veneno em seus anéis tornou-se talvez seu último trunfo no
jogo político.


(*) Antonio Lassance é cientista político.

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