seg, 05/05/2014 - 08:14
- Atualizado em 05/05/2014 - 08:19
O PT e seu governo vivem o pior momento desde que a agremiação - Atualizado em 05/05/2014 - 08:19
assumiu o poder em 2003. O partido vem perdendo a batalha intelectual e
moral junto à sociedade e aparece cada vez mais identificado como um
partido corrupto. O próprio presidente Lula disse, com todas as letras,
no último dia dois de maio, que o partido se corrompeu. Ao falar da
origem pobre do partido, da militância aguerrida, Lula constatou que
aquela postura foi abandonada e afirmou que agora “é tudo uma máquina
de fazer dinheiro, que está fazendo o partido ser um partido
convencional.”
O problema, no entanto, não se restringe à substituição da militância
espontânea pela “máquina de fazer dinheiro”. Desde a eclosão da crise
do mensalão, principalmente a partir do início do seu julgamento, o
partido se deixou ser diariamente massacrado e taxado de corrupto, sem
capacidade de expressar reação e de sair da defensiva. O problema se
agravou ainda mais nas semanas recentes, com os episódios de André
Vargas e da crise da Petrobrás.
Na questão do mensalão, o PT conduziu-se pela política da indecisão
e, quem entende de política, sabe que a indecisão é fatal. O partido
nunca reconheceu erros em relação ao episódio. Se tivesse cometido
erros, o mais correto teria sido vir a público, desde o início do
julgamento, reconhecê-los fazendo uma autocrítica, recompondo-se
moralmente com a opinião pública. Se não errou, o partido vem se
comportando de forma covarde. Se é este o caso, está deixando,
passivamente, que se cometa uma injustiça contra seus ex-dirigentes. Se
está convicto de que não errou deveria ter mobilizado a militância
durante o julgamento e, consumada a condenação, deveria mobilizar-se
para exigir uma anistia aos condenados. Em suma, se errou, continua
errando por não fazer autocrítica e se não errou, o erro é mais grave
porque está deixando que se cometa uma injustiça. Junto ao senso comum
vale a máxima: “quem cala consente” e a imagem que se firma é a de que o
partido tem culpa na questão do mensalão.
O PT se desfez da bandeira da luta contra a corrupção e isto é
notável há bastante tempo. Mas três episódios recentes chamaram a
atenção dos observadores políticos. O primeiro diz respeito à suspeita
de graves irregularidades relacionadas ao cartel do metrô e a reforma de
vagões, no Estado de São Paulo, envolvendo os governos tucanos. A
bancada petista da Assembleia Legislativa e o partido como um todo,
estranhamente, não desenvolveram nenhuma grande batalha política para
que as suspeitas fossem investigadas.
O segundo, diz respeito ao expurgo da quadrilha de fiscais que vinha
dilapidando os cofres da prefeitura de São Paulo, promovido pelo
prefeito Haddad. O prefeito chegou a ser criticado por setores do
partido pela ação moralizadora, pois ela afetava, supostamente,
conveniências políticas e alianças com o PSD de Kassab. O terceiro
episódio se refere ao silêncio dos petistas ante a falta de isonomia do
STF em relação ao mensalão mineiro dos tucanos. O mensalão mineiro
ocorreu cerca de sete anos antes do mensalão petista. Sequer chegou a
ser julgado pelo STF, numa clara violação do princípio da isonomia, fato
que denota, mais do que qualquer outro, determinadas escolhas políticas
do Supremo. O PT não promoveu nenhuma denúncia acerca do episódio.
A Aristocratização e Falta de Renovação do PT
É certo que o PT ascendeu ao poder com escassa ideologia republicana
da virtude. Mas, o partido, quando militava na oposição, era portador de
uma ideologia imprescindível ao êxito político: a ideologia da
concepção da política como combate. Esta ideologia estabelecia o vínculo
do partido com uma das virtudes fundamentais para uma política da
moralidade e da construção do bem público: a virtude da coragem. A
ideologia da política como combate e a virtude da coragem são barreiras
fundamentais para bloquear a concepção da política como conveniência e
negócio, que leva à corrupção. São elas que promovem o compromisso e o
radicalismo necessários para estar sempre junto aos setores sociais mais
necessitados e mais pobres.
O poder, os palácios, os gabinetes, as viagens, os bons restaurantes,
os bons salários, a ascensão social, a visibilidade pública, as boas
bebidas, os ternos bem talhados e as novas amizades amoleceram os
corações e as convicções dos petistas que antigamente militavam nas
portas de fábrica, nas ruas, nas universidades, nas greves, no
enfrentamento da polícia etc. Como não abriram as portas dos palácios e
dos gabinetes ao povo, perderam o contato com o mesmo. O povo continua
com a baixa renda e pobre, sem direitos a serviços de qualidade,
humilhado nas periferias. O povo enfrenta as bombas da polícia nas
desocupações violentas e as balas na militarização das favelas do Rio de
Janeiro. O governo deveria ouvir mais o povo e a sociedade civil
organizada e menos marqueteiros que sugerem a Dilma ocupar,
simbolicamente, uma ridícula posição de “rainha no imaginário popular”.
O governo continua subsidiando o grande capital com uma taxa negativa
de juros de 1% através do BNDES. As taxas de juros do povão, endividado
nos bancos ou no cartão de crédito, é superior a 90%. Os trabalhadores
perdem de duas a três horas diárias no transporte público degradado. O
governo subsidia a gasolina para os mais ricos, coloca em risco a
Petrobrás e destrói a indústria do etanol. O fato é que os petistas,
encastelados nos palácios e nos gabinetes, além de perderem o contato o
povo, estão perdendo o reconhecimento e a fidelidade da juventude, dos
sem teto, dos moradores da periferia, de muitos trabalhadores e da
classe média. Como todo partido, o PT se aristocratizou. Não levou em
conta a necessidade de renovação de quadros, de ideias e de inovação nas
políticas públicas. Cresce no eleitorado o desejo de aplicar uma
vendeta, uma vingança, uma desforra através das urnas, no PT.
O que aconteceu no Ato da CUT, no Primeiro de Maio, quando todos os
políticos foram vaiados e repudiados, é um sintoma dessa vendeta. As
vaias e as hostilidades que o Secretário Geral da Presidência da
República, Gilberto Carvalho, enfrentou no Sindicato dos Bancários, no
Rio de Janeiro, mostram o tom crítico com que parte da sociedade vê o
governo. O fato é que o PT começa a ficar um partido acuado nos
ambientes sociais mais amplos. Há quase um consenso acerca dos erros de
condução da política econômica do governo, fato reconhecido até por
economistas e analistas petistas ou simpatizantes do partido.
A situação se agrava também porque o partido e o governo estão
perdendo o compasso da política, situados cada vez mais numa posição de
acuo, de defensiva. A campanha eleitoral começa a dominar o ambiente. Há
pouco tempo e pouca margem de manobra para o governo e para o partido. É
verdade que o PT é, ainda, o partido mais preferido pelo eleitorado.
Conta com uma base militante ampla. Mas esta é um exército
desmobilizado, mal conduzido e com baixa moral. Talvez, uma reação mais
forte seja possível se o partido levar a sério o duro soco no estômago
que lhe aplicou o presidente Lula no último dia dois de maio.
Aldo Fornazieri – Cientista Político e Professor da Escola de Sociologia e Política.
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