segunda-feira, 5 de maio de 2014

Uma grande traição

 

Janio de Freitas 





Ainda a cinco meses das urnas, nem feitas as convenções partidárias que
oficializem as candidaturas, já estamos em plena campanha eleitoral. Nem
sequer começou há pouco, vindo em aceleração crescente desde ao menos
três meses. É um processo alucinado, já pelas irreprimidas violações à
legislação eleitoral, mas, sobretudo, pelos enormes danos. Inclusive o
de deformações antecipadas do governo a surgir.
A recusa de reforma política e de uma reforma eleitoral verdadeira e
rigorosa é uma traição de muitos autores ao presente e ao futuro da
democracia no Brasil. Depois de sê-lo ao passado pós-ditadura.
A dimensão geográfica do país traz, em princípio, dificuldades grandes a
campanhas menos longas de candidatos à Presidência. Mas, com a
intensidade de seus roteiros de visitas e comícios em três, quatro
cidades por dia, Juscelino, Juarez, Jânio, Lott e outros percorreram o
eleitorado em todos os quadrantes, antes de 64, nas campanhas
concentradas entre dois e, no máximo, três meses.
De lá para cá, a TV é, para os candidatos, como uma viagem ao país todo
em um mesmo tempo. Viagem repetida várias vezes ao dia pelos
telejornais. E outra grande viagem, no horário eleitoral dito gratuito,
paga pelos cidadãos, satisfeitos ou não com os candidatos oferecidos. Os
jatinhos tornaram velozes e luxuosamente cômodas as viagens que são
feitas só para as aparências de campanha com povo. As presunçosas
empresas de publicidade e marketing pensam pelo candidato, sopram-lhe
cada palavra, determinam-lhe os gestos, a roupa, o penteado. A internet
trouxe as ferramentas instantâneas para mais propaganda e para as
baixezas da disputa. Por que tantos meses de campanha, então?
A duração das campanhas traduz-se em custos. Os custos exigem
arrecadação. A arrecadação volumosa é obtida das empresas, dos setores e
dos financeiramente poderosos que têm interesses projetados por
antecipação nas políticas e concessões do futuro governo. E de bancadas
no Senado e na Câmara capazes de dar favorecimento legal a tais
interesses, políticas e concessões. O país e as aspirações da sociedade
não entram nesse capítulo.
A modalidade das campanhas longas, e seu consequente custo, é uma das
causas mais fortes da política rasteira e corrompida que se vê hoje no
Brasil, nada movendo-se na sociedade, nem na própria política, para
corrigi-la. Os poderes provenientes dessas eleições formam-se já
comprometidos ou, nos melhores casos individuais, condicionados pela
degradação à sua volta.
Em termos econômicos e administrativos, os efeitos deletérios das
campanhas longas têm um exemplo na sucessão de Fernando Henrique, nas
eleições de 2002. Se bem que a campanha não fosse tão longa quanto a
atual começa a ser. Mas foi o suficiente para perturbar mais o governo
entre a situação econômica que se deteriorava, com o Real ameaçado pela
volta crescente da inflação, e os seus objetivos eleitorais, de não
prejudicar José Serra e não favorecer Lula. Prejudicado ficou o país,
com a deterioração econômica e a alta inflacionária, cabendo ao governo
Lula o desacreditado crédito de salvar o Real.
Os componentes objetivos da já agressiva campanha atual são outros. Mas
os ingredientes são similares, quando não são os mesmos. Tudo no
Congresso, ou na política em geral, e nos meios de comunicação, se
relaciona com a eleição presidencial. O governo tem dificuldade de agir,
de ser governo, no jogo das circunstâncias. Prejudicado é o país, perde
a sociedade.
E tudo continuará igual para daqui a quatro anos.

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